Pular para o conteúdo principal

A imparcialidade do óbvio

Se Moro, Dallagnol e seus coleguinhas da Lava Jato tivessem agido rigorosamente dentro dos limites da lei, fora do jogo político, não haveria nada de interesse público para vazar e a operação não estaria hoje sob suspeita. Ela seria inabalável.

Não haveria nada para a defesa de Lula acessar, nada para o STF liberar. Absolutamente nada para o questionável Gilmar Mendes questionar, com razão. As mensagens vazadas, a priori, não inocentam Lula, mas incriminam seus justiceiros.

Corruptos que a força-tarefa descobriu e prendeu, acusados, réus e condenados, doutores em Direito, juízes, desembargadores, procuradores, promotores, advogados, jornalistas e milhões de cidadãos brasileiros, inclusive antipetistas, não teriam nenhum motivo para questionar a lisura da Lava Jato se ela fosse, na prática, exemplar.

Mas as mensagens secretas reveladas por Intercept Brasil e outros veículos de comunicação não deixam mais nenhuma dúvida sobre os métodos ilegais usados pelo então juiz e por procuradores. E não cola mais tentar desqualificar os autores das reportagens, criminalizar o jornalismo para tentar colocar em dúvida a autenticidade dos diálogos. As falas de Moro já deram todos os sinais de que o material exposto é verdadeiro. E muita coisa já foi periciada pela Polícia Federal.

Os hackers de Araraquara, criminosos, vale salientar, deram à luz o submundo da operação que, em tese, era o símbolo da honestidade no pântano da corrupção brasileira. Os bandidos desmascararam os mocinhos.

Enfim, se quisessem que a Lava Jato fosse um instrumento de justiça, e não um movimento político, deveriam ter agido com independência, imparcialidade e legalidade. Isto, sim, seria normal, Moro. Se existissem essas garantidas, restariam no campo dos questionamentos à Lava Jato somente os corruptos. Estariam falando sozinhos e, obviamente, atrás das grades, por muitos e muitos anos.

Allysson Teotonio

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

De peito aberto

Era uma terça-feira, não era um dia qualquer pra mim. O sol ainda não havia chegado, mas a minha ansiedade estava reluzente. Cheguei ao hospital às 5:43 da manhã. Era um misto de medo e esperança, e o coração prestes a sair pela boca. No dia 5 de setembro, fui submetido a uma cirurgia no coração. O procedimento (aberto), inevitável para me livrar de um aneurisma na aorta ascendente do coração, aconteceu no John Muir Medical Center, em Concord, Califórnia. A cirurgia foi um sucesso, e o processo de recuperação segue bem, dentro da normalidade. Já estou em casa, após cinco dias hospitalizado. Comandada pelo cirurgião-chefe Murali Dharan, a equipe foi impecável antes, durante e depois da cirurgia.  Ah, é importante voltar alguns anos no tempo pra contar melhor essa história. Descobri o aneurisma em João Pessoa, em 2012, ao fazer exames de rotina. Na época, a cirurgia não era necessária porque o tamanho da dilatação era pequeno.  Durante cinco anos, fui acompanhado pelos médicos A...

O fanatismo é uma prisão

Tudo que acontece na vida tem uma causa. Não necessariamente é obra, castigo ou ausência de Deus. Muitas vezes é tão somente consequência de nossos atos mundanos. É imprescindível estar atento a cada ato, a cada passo. Não permita que a sua fé se transforme em fanatismo. Pois, se isso acontece, perde-se a capacidade de compreender a realidade.  O Brasil de hoje, em pleno debate eleitoral, precisa mais do que nunca compreender a realidade. Fincar os pés no chão, não no céu. O momento exige a defesa intransigente da Constituição, o livro que rege o país de todos, não de alguns. O livro que garante, inclusive, a sua liberdade religiosa. A vida espiritual não deve anular a vida real. Uma complementa a outra; elas se retroalimentam. Perder a compreensão da realidade é viver em um mundo que não existe, alienado. É uma prisão – e não há saída. Não permita que os vendedores da palavra de Deus comprem a sua consciência, o seu discernimento, a sua liberdade, a sua crença, a sua alma, a sua f...

PAREM

Parem de misturar religião com eleição, parem de usar igreja como palanque. O debate é político, é sobre economia, saúde, educação, segurança, meio ambiente, ciência, tecnologia. É sobre governo, gestão pública.  Parem. O debate não é sobre fé, crença, descrença, Bíblia. É sobre a Constituição Federal. É sobre fome, desemprego, miséria, democracia, injustiças, desigualdade social.  Parem. O debate não é sobre Deus e o diabo, céu e inferno. É sobre gente, de carne e osso. É sobre o povo que tem mais osso e menos carne na mesa e no corpo. Parem de usar o nome de Cristo como cabo-eleitoral. O debate não é sobre Jesus. É sobre o homem imperfeito que deve ser eleito presidente, capaz de governar com respeito e compaixão. Não é sobre católicos e evangélicos, é sobre brasileiros. O debate é sobre quem não pode governar apenas para os iguais, mas também para os diferentes. Parem de sabotar o debate político-eleitoral. Parem de sabotar o soberano exercício democrático. O Estado é laico...